As vacinas são amplamente consideradas uma das maiores conquistas médicas do mundo moderno.
Todos os anos, elas impedem cerca de 2 a 3 milhões de mortes, ao combater mais de 20 doenças fatais, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Doenças infantis que eram comuns na geração passada são cada vez mais raras hoje. E a varíola, que matou centenas de milhões de pessoas, foi erradicada.
Mas esses sucessos levaram décadas para serem alcançados, e muitos de nós agora esperamos que vacinas eficazes contra o coronavírus tenham resultados semelhantes em um período de tempo radicalmente mais curto.
As notícias de que algumas das vacinas recentemente anunciadas têm uma eficácia acima de 90%, ou seja, cerca de nove em cada dez pessoas que as recebam estariam protegidas contra a covid-19, levaram muitos a acreditar que em breve poderíamos estar abandonando o distanciamento social e descartando nossas máscaras faciais.
Nos EUA e no Reino Unido, onde a aprovação regulatória para as vacinas já foi dada e programas de vacinação em massa estão sendo planejados, alguns até sugeriram que a vida poderia voltar ao normal no início de 2021.
Mas muitos cientistas e especialistas em saúde global estão alertando que as vacinas, com suprimentos iniciais limitados e distribuição a grupos selecionados, embora protegendo grupos vulneráveis e profissionais de saúde da linha de frente, provavelmente não nos transportarão de volta ao nosso antigo modo de vida tão cedo.
Foi o que disse o próprio diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus.
“Uma vacina irá complementar as outras ferramentas que temos, não substituí-las”, disse ele. “Uma vacina por si só não vai acabar com a pandemia.”
Uma explicação para essa lacuna de expectativas, entre o otimismo de alguns políticos e do público, por um lado, e a hesitação de muitos profissionais da ciência por outro, poderia ser, em parte, a falta de compreensão de quão grande é a missão de obter vacinas suficientes para um número considerável de pessoas.
O que muitos de nós talvez não percebam é que, quando falamos de doenças infecciosas (aquelas que passam de pessoa para pessoa), para proteger verdadeiramente a todos, precisamos vacinar em grande número.
Isso ocorre porque o poder de uma vacina não está apenas em sua capacidade de nos proteger como indivíduos, mas em sua capacidade de proteger as pessoas ao nosso redor e as comunidades em que vivemos.
O problema é que nenhuma vacina é 100% eficaz.
A vacina contra o sarampo é uma das melhores e protege 95% a 98% das pessoas.
As vacinas da Pfizer/BioNTech e da Moderna contra a covid-19 recentemente anunciadas, com eficácia de mais de 90%, também são insuficientes, e ainda não sabemos se essa porcentagem diminuirá com o tempo ou fora das condições do ensaio clínico.
Isso significa que cerca de uma em cada dez pessoas não estaria protegida contra a covid-19, mesmo se vacinássemos todas as pessoas. Sem 100% de cobertura, o que é improvável em qualquer programa de vacinação, o número de pessoas em risco seria maior.
Já sabemos que as pessoas mais velhas tendem a ter uma resposta mais fraca à vacinação, embora as vacinas contra o coronavírus tenham resultados encorajadores a esse respeito.
Além disso, algumas pessoas em nossas comunidades, por motivos de saúde, como aquelas que estão passando por algumas formas de tratamento contra o câncer, talvez não possam ser vacinadas.
Isso significa que um grupo significativo de pessoas ao nosso redor sempre estará em risco. Alguns de nossos amigos e familiares podem estar entre eles.
Mas ainda há uma maneira de garantir que protegemos indiretamente a todos: aproveitando o poder da vacinação em massa.
Se vacinarmos um número suficiente de pessoas em nossa comunidade, algo incrível pode acontecer. Criaremos vários escudos invisíveis que interromperão a cadeia de transmissão do patógeno (como um vírus ou bactéria), protegendo indiretamente nossos amigos e familiares vulneráveis.
Isso é chamado às vezes de imunidade de grupo ou imunidade de rebanho.
Os cientistas ressaltam que, até que tenhamos vacina suficiente para ir além da vacinação de grupos de risco contra a covid-19 e atingir uma grande proporção da população, o distanciamento social não chegará ao fim.
“Se protegermos apenas os vulneráveis, interromperemos as mortes que estão acontecendo nesse grupo e reduziremos a carga sobre os hospitais, mas não interromperemos a transmissão”, diz Salisbury.
Ou seja, a transmissão continuará entre as pessoas que não foram vacinadas, que podem então espalhar o vírus para pessoas vulneráveis não vacinadas e pessoas vulneráveis que foram vacinadas, mas não apresentaram uma resposta imunológica protetora, explica.
Isso inevitavelmente significa que, para evitar o desenvolvimento de bolsões de transmissão e a exposição de amigos e familiares vulneráveis em nossas comunidades, precisaremos atingir altos níveis de vacinação em todas as idades em todas as áreas geográficas.
Dado o quão interconectado o mundo está em termos de movimento de pessoas e comércio, isso também significa fazer o mesmo em todos os países do mundo.
“Esta é uma pandemia, não é uma epidemia nacional, então, temos que parar o vírus em todos os lugares, e, até conseguirmos isso, nenhum lugar permanecerá seguro”, diz Salisbury.
E há ainda outra barreira que pode retardar a tarefa de alcançar pessoas suficientes.
As autoridades de saúde terão que superar o número crescente de pessoas que relutam em receber vacinas — um fenômeno considerado uma das dez principais ameaças à saúde global pela OMS.
No Reino Unido, cerca de 36% das pessoas disseram que não tinham certeza ou consideravam muito improvável se concordariam em ser vacinadas, indicou um estudo realizado por instituições científicas do país, como a British Academy e a Royal Society.
Números semelhantes foram registrados por uma enquete do YouGov no mês passado.
Essa resistência, junto com o aumento da desinformação sobre a vacinação — o chamado movimento antivacina — pode tornar a imunidade de rebanho mais difícil de ser alcançada em muitos países.
Ghani sugere que tranquilizar as pessoas que estão atualmente se sentindo “um pouco nervosas” sobre a rapidez com que as vacinas covid-19 foram desenvolvidas será crucial.
Então, uma vacina pode realmente trazer de volta a normalidade?
Apesar dos desafios científicos e práticos de fornecer uma vacina eficaz em todo o mundo, a boa notícia é que parece provável que as vacinas de primeira geração terão um impacto significativo na batalha global contra a covid-19.
A curto prazo, elas ajudarão a evitar que os mais vulneráveis em nossas comunidades desenvolvam doenças graves e morram, especialmente os idosos com doenças pré-existentes e os profissionais de saúde da linha de frente.
O anúncio da Pfizer/BioNTech de que sua vacina parece proteger 94% dos adultos com mais de 65 anos é importante nesse desafio.
A má notícia é que pode levar meses ou anos para vacinar um número suficiente da população global para tornar seguro todo o mundo interconectado e chegar a um ponto em que todos possamos voltar ao normal.
Insinuações de que as vacinas seriam capazes de nos levar de volta para o que éramos antes da covid-19 na próxima Páscoa deram às pessoas uma expectativa não realista, diz Salisbury, e tal resultado, na ausência da interrupção da transmissão, é “improvável” .
Mesmo em países com boa infraestrutura de saúde e experiência em programas de vacinação em massa será um desafio alcançar pessoas suficientes para quebrar a cadeia de transmissão, diz ele.
Embora as perspectivas para os grupos de risco sejam “indubitavelmente melhores” no próximo ano, afirma Salisbury, o restante de nós provavelmente tomaremos medidas extras por algum tempo, algo que ele se refere como “vacina plus”.
Ghani concorda e estima que levará mais dois anos para “fazer o mundo todo voltar ao normal”, mas com o processo provavelmente mais rápido para países de alta renda.
Mas ela adverte que, embora as vacinas possam acabar com a pandemia, elas não vão “nos livrar do vírus”, e o mundo precisará “continuar vacinando”, assim como faz com outras doenças.
Portanto, com uma nova era de “vacina plus” possivelmente surgindo na batalha contra a covid-19, é provável que 2021 nos obrigue a continuar mantendo todas as precauções por vários meses — e possivelmente mais.
As vacinas são amplamente consideradas uma das maiores conquistas médicas do mundo moderno.
Todos os anos, elas impedem cerca de 2 a 3 milhões de mortes, ao combater mais de 20 doenças fatais, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Doenças infantis que eram comuns na geração passada são cada vez mais raras hoje. E a varíola, que matou centenas de milhões de pessoas, foi erradicada.
Mas esses sucessos levaram décadas para serem alcançados, e muitos de nós agora esperamos que vacinas eficazes contra o coronavírus tenham resultados semelhantes em um período de tempo radicalmente mais curto.
As notícias de que algumas das vacinas recentemente anunciadas têm uma eficácia acima de 90%, ou seja, cerca de nove em cada dez pessoas que as recebam estariam protegidas contra a covid-19, levaram muitos a acreditar que em breve poderíamos estar abandonando o distanciamento social e descartando nossas máscaras faciais.
Nos EUA e no Reino Unido, onde a aprovação regulatória para as vacinas já foi dada e programas de vacinação em massa estão sendo planejados, alguns até sugeriram que a vida poderia voltar ao normal no início de 2021.
Mas muitos cientistas e especialistas em saúde global estão alertando que as vacinas, com suprimentos iniciais limitados e distribuição a grupos selecionados, embora protegendo grupos vulneráveis e profissionais de saúde da linha de frente, provavelmente não nos transportarão de volta ao nosso antigo modo de vida tão cedo.
Foi o que disse o próprio diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus.
“Uma vacina irá complementar as outras ferramentas que temos, não substituí-las”, disse ele. “Uma vacina por si só não vai acabar com a pandemia.”
Uma explicação para essa lacuna de expectativas, entre o otimismo de alguns políticos e do público, por um lado, e a hesitação de muitos profissionais da ciência por outro, poderia ser, em parte, a falta de compreensão de quão grande é a missão de obter vacinas suficientes para um número considerável de pessoas.
O que muitos de nós talvez não percebam é que, quando falamos de doenças infecciosas (aquelas que passam de pessoa para pessoa), para proteger verdadeiramente a todos, precisamos vacinar em grande número.
Isso ocorre porque o poder de uma vacina não está apenas em sua capacidade de nos proteger como indivíduos, mas em sua capacidade de proteger as pessoas ao nosso redor e as comunidades em que vivemos.
O problema é que nenhuma vacina é 100% eficaz.
A vacina contra o sarampo é uma das melhores e protege 95% a 98% das pessoas.
As vacinas da Pfizer/BioNTech e da Moderna contra a covid-19 recentemente anunciadas, com eficácia de mais de 90%, também são insuficientes, e ainda não sabemos se essa porcentagem diminuirá com o tempo ou fora das condições do ensaio clínico.
Isso significa que cerca de uma em cada dez pessoas não estaria protegida contra a covid-19, mesmo se vacinássemos todas as pessoas. Sem 100% de cobertura, o que é improvável em qualquer programa de vacinação, o número de pessoas em risco seria maior.
Já sabemos que as pessoas mais velhas tendem a ter uma resposta mais fraca à vacinação, embora as vacinas contra o coronavírus tenham resultados encorajadores a esse respeito.
Além disso, algumas pessoas em nossas comunidades, por motivos de saúde, como aquelas que estão passando por algumas formas de tratamento contra o câncer, talvez não possam ser vacinadas.
Isso significa que um grupo significativo de pessoas ao nosso redor sempre estará em risco. Alguns de nossos amigos e familiares podem estar entre eles.
Mas ainda há uma maneira de garantir que protegemos indiretamente a todos: aproveitando o poder da vacinação em massa.
Se vacinarmos um número suficiente de pessoas em nossa comunidade, algo incrível pode acontecer. Criaremos vários escudos invisíveis que interromperão a cadeia de transmissão do patógeno (como um vírus ou bactéria), protegendo indiretamente nossos amigos e familiares vulneráveis.
Isso é chamado às vezes de imunidade de grupo ou imunidade de rebanho.
Os cientistas ressaltam que, até que tenhamos vacina suficiente para ir além da vacinação de grupos de risco contra a covid-19 e atingir uma grande proporção da população, o distanciamento social não chegará ao fim.
“Se protegermos apenas os vulneráveis, interromperemos as mortes que estão acontecendo nesse grupo e reduziremos a carga sobre os hospitais, mas não interromperemos a transmissão”, diz Salisbury.
Ou seja, a transmissão continuará entre as pessoas que não foram vacinadas, que podem então espalhar o vírus para pessoas vulneráveis não vacinadas e pessoas vulneráveis que foram vacinadas, mas não apresentaram uma resposta imunológica protetora, explica.
Isso inevitavelmente significa que, para evitar o desenvolvimento de bolsões de transmissão e a exposição de amigos e familiares vulneráveis em nossas comunidades, precisaremos atingir altos níveis de vacinação em todas as idades em todas as áreas geográficas.
Dado o quão interconectado o mundo está em termos de movimento de pessoas e comércio, isso também significa fazer o mesmo em todos os países do mundo.
“Esta é uma pandemia, não é uma epidemia nacional, então, temos que parar o vírus em todos os lugares, e, até conseguirmos isso, nenhum lugar permanecerá seguro”, diz Salisbury.
E há ainda outra barreira que pode retardar a tarefa de alcançar pessoas suficientes.
As autoridades de saúde terão que superar o número crescente de pessoas que relutam em receber vacinas — um fenômeno considerado uma das dez principais ameaças à saúde global pela OMS.
No Reino Unido, cerca de 36% das pessoas disseram que não tinham certeza ou consideravam muito improvável se concordariam em ser vacinadas, indicou um estudo realizado por instituições científicas do país, como a British Academy e a Royal Society.
Números semelhantes foram registrados por uma enquete do YouGov no mês passado.
Essa resistência, junto com o aumento da desinformação sobre a vacinação — o chamado movimento antivacina — pode tornar a imunidade de rebanho mais difícil de ser alcançada em muitos países.
Ghani sugere que tranquilizar as pessoas que estão atualmente se sentindo “um pouco nervosas” sobre a rapidez com que as vacinas covid-19 foram desenvolvidas será crucial.
Então, uma vacina pode realmente trazer de volta a normalidade?
Apesar dos desafios científicos e práticos de fornecer uma vacina eficaz em todo o mundo, a boa notícia é que parece provável que as vacinas de primeira geração terão um impacto significativo na batalha global contra a covid-19.
A curto prazo, elas ajudarão a evitar que os mais vulneráveis em nossas comunidades desenvolvam doenças graves e morram, especialmente os idosos com doenças pré-existentes e os profissionais de saúde da linha de frente.
O anúncio da Pfizer/BioNTech de que sua vacina parece proteger 94% dos adultos com mais de 65 anos é importante nesse desafio.
A má notícia é que pode levar meses ou anos para vacinar um número suficiente da população global para tornar seguro todo o mundo interconectado e chegar a um ponto em que todos possamos voltar ao normal.
Insinuações de que as vacinas seriam capazes de nos levar de volta para o que éramos antes da covid-19 na próxima Páscoa deram às pessoas uma expectativa não realista, diz Salisbury, e tal resultado, na ausência da interrupção da transmissão, é “improvável” .
Mesmo em países com boa infraestrutura de saúde e experiência em programas de vacinação em massa será um desafio alcançar pessoas suficientes para quebrar a cadeia de transmissão, diz ele.
Embora as perspectivas para os grupos de risco sejam “indubitavelmente melhores” no próximo ano, afirma Salisbury, o restante de nós provavelmente tomaremos medidas extras por algum tempo, algo que ele se refere como “vacina plus”.
Ghani concorda e estima que levará mais dois anos para “fazer o mundo todo voltar ao normal”, mas com o processo provavelmente mais rápido para países de alta renda.
Mas ela adverte que, embora as vacinas possam acabar com a pandemia, elas não vão “nos livrar do vírus”, e o mundo precisará “continuar vacinando”, assim como faz com outras doenças.
Portanto, com uma nova era de “vacina plus” possivelmente surgindo na batalha contra a covid-19, é provável que 2021 nos obrigue a continuar mantendo todas as precauções por vários meses — e possivelmente mais.
Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/geral-55249190